18 abril 2005

RELAX - Uma mina na crise

As sociedades de hoje são sociedades extremamente competitivas que exigem dos seus membros cargas de trabalho que estão, na maioria dos casos, muito para além da resistência normal, física e psíquica, do comum dos mortais.

A agitação permanente, as bichas intermináveis de trânsito, a sinfonia do telemóvel, a letra que foi para protesto, os cheques carecas, os processos de reengenharia, a lei das quarenta horas, os projectos de investimento chumbados, o trabalho de casa (sempre no escritório até altas horas da madrugada), os opíparos jantares com potenciais clientes ou parceiros de negócios chorudos, uma cara-metade que ultrapassou o prazo de validade, são tudo factores que deixam executivos e empresários à beira de um ataque de nervos permanente. A vida desta gente é um verdadeiro inferno.

Tenho para mim que este grupo sócio-profissional é um grupo de alto risco e terreno fértil para a proliferação das designadas doenças modernas - stress, ataques cardíacos, impotências funcionais de vária ordem, distúrbios psíquicos, etc., etc..

Ora, numa sociedade em que a paranóia da qualidade de vida, abrangendo todas as áreas da vida de relação de um ser humano, está definitivamente instalada, fácil é concluir que aquele grupo constitui um verdadeiro nicho de mercado para negócios de elevado potencial de rendimento. E a verdade é que estas oportunidades vieram determinar iniciativas empresariais do mais variado tipo e em crescente desenvolvimento. É um mercado altamente rentável e em que a máxima é: qualidade de serviço e satisfação total do cliente.

Numa fase ainda incipiente de todo este processo, o normal era o recurso a fármacos da família dos ansiolíticos e dos anti-depressivos, o recurso a psicólogos, psiquiatras e psicanalistas e, mais tarde, a ida ao ginásio e à piscina, uma partida de ténis ao fim-de-semana ou um torneio de golfe. Mais recentemente, parece que se chegou à conclusão que todos aqueles meios, embora pudessem ter algum efeito benéfico, ficavam muito aquém da terapia adequada.

Eis que surge então um novo tipo de oferta, designado pelo mercado do “Relax”.

Basta abrir um qualquer jornal diário de grande tiragem nacional, ou até mesmo regional, folheá-lo de fio a pavio, e ao desaguar na página de anúncios classificados, encontramos a curiosa secção de “RELAX”.

Anúncios curtos, mensagem eficaz, descrição rigorosa do serviço, bem dirigidos, cumprindo com a fórmula mágica da publicidade : Atenção, Interesse, Desejo e Acção, o essencial da comunicação com potenciais clientes.

Passemos então à análise do perfil da oferta, nos oitenta e quatro anúncios publicados num dos tais jornais e que, por razões óbvias, omito o respectivo título.

Serviço: Massagens

1. Género predominante no exercício da profissão: Feminino. (Só registamos 2 elementos masculinos).

2. Escalão etário das Massagistas: 18 -24 anos, 95%; Superior a 24 anos, 5%.

3. Atributos das Massagistas: Meigas e muito gostosas: 65%; Mulheres de Sonho: 17%; Sedutoras: 8%; Bonecas: 7%; Gatas ou gatinhas: 3%.

4. Características físicas das Massagistas: 1,70m ou mais: 80 %; Pt. 42: 67%; Olhos verdes: 42%; Olhos azuis: 37%; Morenas: 54 %; Louras: 32%; Tropicais/Brasileiras/Mulatinhas: 53%.

5. Local da Prestação dos serviços: Ápartamento Próprio: 95%; Domicílios e Hotéis: 5%;

6. Horário: Serviço 24H: 87%; 10/24H: 8%; Só noites: 5%.

7. Forma de pagamento: Cartão de crédito, cheque ou “cash”. Não há fiados.

8. Público-alvo: Solitários/Executivos de 1ª linha/Homens de negócios/Casos perdidos para a psicologia, psiquiatria e psicanálise. Essencial: Ter gravetame que se veja.

9. Meio de contacto: Telemóvel: 100%.

10. Outras referências: 10% deslocam-se a qualquer ponto do país. A esmagadora maioria trabalha os mercados de proximidade ou locais.

11. Bónus: 37% das ofertas referem o recurso a meios auxiliares de terapia – massagens relaxantes, vídeos, cintas, and so on; 70% dão 2ª oportunidade e há mesmo quem ofereça 3ª. Ou seja, não pegou à primeira, pega à 2ª ou à 3ª. Ou então, sangria completa do óleo até o depósito ficar limpo.

Finalmente, falemos da importância económica do sector do Relax.
Para que se possa ter uma ideia da importância económica deste sector, consultei um “expert” neste tipo de mercado que me adiantou que o volume de negócios/dia, realizado pelo universo dos 84 anúncios analisados, situar-se-á nos 100.000 Euros, sem que daí resulte qualquer receita fiscal. Este é o busílis da questão – evasão fiscal.
Mas por outro lado, o volume de emprego assegurado, para aquele nível de volume de negócio, andará na casa dos 100 postos de trabalho.
E para quem chegou até aqui e não dê por mal empregue o tempo que perdeu a ler esta treta, registe que este é um dos exemplos a que os economistas e políticos chamam de economia informal. Para explicar uma coisa tão simples, porque não falar de coisas que o povo entende e gosta? Percebeu-se agora todo o meu esforço, não se percebeu?
Obrigado!

15 abril 2005

"Directas" para Papa no próximo Concílio

Influenciados pela vaga das "directas" que varre os dois maiores partidos portugueses, os Cardeais do Colégio Cardinalíceo ponderam seriamente seguir a experiência portuguesa.
Há vozes que vão exigir ao próximo Papa a convocatória de um Concílio para que o processo seja contemplado. Assim, os católicos de todo o mundo serão chamados a eleger o chefe máximo da sua Igreja através de voto secreto e universal.
Este é o próximo passo da Renovação e da Revolução.
Pela 1ª vez na História da Humanidade, o Mundo irá partilhar a experiência do voto transnacional.
Desde a recôndita Patagónia à mais cosmopolita aldeia transmontana, o princípio de cada cabeça um voto vai ser uma realidade.
A Compta, empresa que trabalhou para o Ministério da Educação na colocação dos professores, vai apresentar ao Vaticano uma proposta para resolver o problema da votação através do voto electrónico.
Segundo um responsável da empresa, "esta é uma janela de oportunidade para a sua internacionalização, depois do bom trabalho realizado para o Ministério da Educação.".
Ao que se sabe, a Compta tem já preparado um dossiê de apresentação, com uma carta de recomendação do ex-Ministro da Educação, David Justino.
Círculos próximos do Vaticano admitem que a candidatura da Compta será muito forte e fará a Microsoft pensar duas vezes.
Bill Gates já nem dorme!

14 abril 2005

Diário 6

Faz-se noite.
Esconde-se a lua
E solta-se o luar
Do teu olhar!

Se descodificares, dou-te um doce!

Pois é amigas e amigos! Nem sempre é fácil descodificar discursos correntes, mesmo em português escorreito.

O Bino Talhante anda por aí a vender azeite às canadas, não porque vende cuia e compra cabaça, mas porque vendeu a manta. Diz-se à boca cheia que o Tone Barbicha, que é de Braga e chama-se Lourenço, tirou o cabaço à dita cuja e o Bino, que sai ao pau da racha, ficou mamado. Como diz o povo, quem está no ripanço arrisca-se a cotovio.
Moral da história: Quem se mete com cóias, está quilhado!

Não percebes? Queres legendas ou preferes dobrado?
Teletexto, pág. 535.

Isto é um País de "empreitas"


A "linguagem do betão" chegou a todo o canto e esquina. Na política, então, é mato.
Veja-se como é empregue a esmo a palavrinha "pilar"!
"Pilar" é, nem mais nem menos, uma "coluna que sustenta uma construção".
Mas não há discurso político digno de nota que não seja polvilhado, e bem polvilhado, com "pilares".
Veja-se: "Os três pilares da democracia...", "as nossas políticas sociais assentam em três pilares ...", "os três pilares que sustentarão as nossas reformas estruturais...", etc., etc..
É a típica linguagem dos "empreitas" invadindo a política. E é chic, pois claro.
Depois não se admirem de haver por aí muitas cabecinhas cheias de areão!

A juntar a este original discurso, outra das curiosidades que tenho notado é o número de pilares que é referido! Geralmente são sempre três. Porquê, essa fixação nos três? Será que os três assumem assim uma importância tão decisiva? Sem os três as coisas não funcionam? Alguém sabe explicar? E mais não digo, senão ainda me acusam de linguarudo.

12 abril 2005

As despedidas à Santana

Santana sem nada para dizer ao Congresso Laranja, enrolou quanto pôde, para, no primeiro discurso, anunciar solenemente: "Vou andar por aí.". E se Deus quiser até vai. A menos que faça como o Portas.

Não satisfeito e porque terá percebido que os laranjas não o perceberam, volta à carga numa segunda intervenção.
Blá, blá, trréu-péu-péu...pardais ao ninho e lá vai dizendo que nunca se despede dos filhos, que nunca os leva à estação do combóio ou ao aeroporto, etc. e tal, para concluir afinal que não gosta de despedidas.

E termina desta forma eloquente: «Detesto despedidas e, por isso, nunca me despeço. Até amanhã, se Deus quiser.»
Até amanhã, Santana. A malta nunca se despede. É despedida.

11 abril 2005

De Eugénio de Andrade...


ADEUS

Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mãos à força de as apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras das esquinas
em esperas inúteis.
Meto as mãos nas algibeiras e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro;
era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.
Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes.
E eu acreditava.
Acreditava,
porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.
Mas isso era no tempo dos segredos,
era no tempo em que o teu corpo era um aquário,
era no tempo em que os meus olhos
eram realmente peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco, mas é verdade,
uns olhos como todos os outros.
Já gastámos as palavras.
Quando agora digo: meu amor,
já se não passa absolutamente nada.
E no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.
Não temos já nada para dar.
Dentro de ti
não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão gastas.
Adeus.

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